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O duplo mistério da presença de Jesus

No dia 22 de fevereiro — III aniversário da aprovação pontifícia dos Arautos do Evangelho — comemora-se a festa da Cátedra de Pedro, centro da unidade e santidade da Igreja. O Papa atrai milhões de fiéis a Roma. O que buscam eles? O que os move nesse interminável cortejo à procura do Vigário de Cristo, o “rei das almas”?

Roberto Kasuo

altarPassando diante de uma igreja no momento em que badalavam os sinos, certa ocasião, um jovem professor universitário instintivamente olhou para o relógio da torre, a fim de conferir as horas. Esse fato tão corriqueiro lembrou- lhe uma grande verdade: assim como o relógio da Matriz marca as horas do dia para os paroquianos, um outro “relógio” regula o pensamento da humanidade inteira: o ensinamento infalível da Santa Igreja Católica, Apostólica e Romana, Mãe e Mestra da Verdade.

Quão falho e volúvel é o juízo humano! O que seria da História se não houvesse uma autoridade infalível, perene e universal a nos guiar?

Esse relógio sobrenatural — que não indica as horas, mas aponta para a Verdade — é a Sé Apostólica. “Tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja; as portas do inferno não prevalecerão contra ela. Eu te darei as chaves do Reino dos Céus: tudo o que ligares na terra será ligado nos Céus, e tudo o que desligares na terra será desligado nos Céus” (Mt 16, 18-19), afirmou Jesus ao primeiro dos Papas.

Prometeu ainda o Redentor permanecer com sua Igreja até a consumação dos séculos. Uma vez tendo-se encarnado, haveria para o gênero humano maior benefício do que o Verbo de Deus manter, de alguma forma, sua presença na terra? Como se realiza essa maravilha depois de sua Ascensão ao Céu? Primeiramente, pelo sacramento da Eucaristia, está Nosso Senhor presente entre nós em corpo, sangue, alma e divindade.

Porém, por mais admirável que isso seja, é uma presença invisível, embora real. Ora, nossa natureza pede algo mais.

Onde encontrar hoje aquele Jesus-Homem que pregava às multidões na Galiléia, que ensinava com autoridade no

Templo e nas sinagogas? Na pessoa dos Sucessores de Pedro, esse mesmo Jesus continua presente entre nós, pelo exercício do supremo Magistério, de sua missão de guia das almas, e de seu poder de juiz das consciências.

Eis o duplo mistério da perpétua presença do divino Mestre na Santa Igreja.

Dois grandes bens da Encarnação: a graça e a verdade

No início de seu Evangelho, São João resume em duas palavras a ação do Verbo Encarnado entre os homens: “E o S PEDROVerbo se fez carne e habitou entre nós, e vimos sua glória, a glória que o Filho único recebe do seu Pai, cheio de graça e de verdade(Jo 1, 14).   

A graça, que santifica, nos é proporcionada pelos sacramentos, de modo especial pela Eucaristia. A verdade, que ilumina as mentes e evita o erro, nos vem através do infalível ensinamento pontifício.

No tabernáculo, Jesus se encontra invisível e envolto no silêncio. Mas de maneira íntima e misteriosa derrama abundantes graças, continuamente. E a verdade infalível que nos guia sem interrupção, encontramos no Papa, seu fiel depositário, defensor e arauto no mundo.

Grandeza na humildade

Bem pobre era aquele estrangeiro que Roma viu chegar, no reinado de Cláudio, pela via Ápia. Atendia pelo nome de Pedro, vestia um manto simples e apoiava-se num bastão de peregrino. No entanto, seus sucessores, três séculos mais tarde, ascenderiam ao mais alto trono da Terra.

Frágeis também eram aqueles varões que, nesses vinte séculos, ocuparam a Cátedra de Pedro. Muitos foram martirizados, outros presos ou exilados.

O homem pode morrer, mas o Papa sobrevive. Ainda hoje — e assim será sempre — as multidões o procuram sem

Na pessoa de Pedro, os fiéis procuram Jesus - Papa Bento XVI

Na pessoa de Pedro, os fiéis procuram Jesus - Papa Bento XVI

 cessar. Buscam elas ouro, poder, influência? Não. Sentir-se-ão felizes se conseguirem vê-lo à distância, na Praça de São Pedro, ou, quiçá, dele receber uma bênção ou mesmo um olhar! Na pessoa de Pedro, é a Jesus que procuram.

Ao longo dos 25 anos de pontificado de João Paulo II, mais de 17 milhões de fiéis participaram da Audiência geral das quartas-feiras. Que monarca ou presidente é tão procurado?

Milagre da verdade indefectível na inconstância do homem

 No Papado, o homem inconstante, sujeito ao erro, assumido pelo Espírito Santo, serve de instrumento à doutrina eterna. Ao longo dos séculos, em meio a todas as ruínas que possam acumular-se em suas mãos, uma coisa perdurará sempre: a verdade divina.

De geração em geração, os Papas portarão a luminosa tocha da Verdade que nenhuma tempestade conseguirá apagar: “Eu roguei por ti [Pedro] a fim de que tua fé não desfaleça; e tu, por tua vez, confirma os teus irmãos” (Lc 22, 32). Com estas palavras, o divino Salvador prometeu uma particular assistência ao chefe da Igreja, em virtude da qual nunca faltará sua fé. Com elas, assegurou a São Pedro e seus sucessores o dom da infalibilidade, isto é, eles não podem errar quando ensinam ex cathedra, em matéria de fé e de costumes.

É o milagre da verdade divina sob as aparências da inconstância humana.

Mistério da santidade na fraqueza

Em conseqüência do peBENTO XVI_Acado, a natureza humana ficou corrompida, seus instintos levam ao mal. Sem embargo, o homem frágil foi escolhido por Deus para, sem desfalecimento nem interrupção, jorrar sobre o mundo o imaculado manancial da graça e da virtude, a doutrina que prega a santidade e os sacramentos que a propiciam.   

Se, como homem, o Papa está sujeito a debilidades, no entanto jamais deixará de cumprir sua missão de santificar as almas. E as fraquezas humanas apontadas pela História, não terão sido permitidas pela Providência justamente para salientar ainda mais que o fundamento da infalibilidade e da imortalidade da Igreja é o próprio Nosso Senhor Jesus Cristo, e não criaturas humanas? Contemplando o Papa, sob certo ponto de vista, não veremos mais que um frágil ancião. Considerando-o, porém, com os olhos da fé, veremos nele Jesus Cristo em sua verdade, em sua autoridade e em seu poder.

Assim como a Eucaristia, o Papado é um mistério de fé. Com olhos humanos, o que vemos na Eucaristia? Pão, nada mais. Com a virtude da fé, porém, desaparecem os véus e cremos em Jesus Cristo atrás das aparências do pão e do homem. 

A Eucaristia, Maria e o Papado

Destinadas a perpetuar a presença de Jesus Cristo na terra, essas duas instituições têm admiráveis enNS FATIMAtrelaçamentos. 

Quando o Papado é exaltado, a Eucaristia é adorada devidamente. E vice-versa, quanto mais adorada a Eucaristia, mais respeitado e amado é o Papa.

Por este motivo, a festa da Cátedra de Pedro reveste-se de grande importância para todo o mundo católico. De modo especial para os Arautos do Evangelho, pois nesse dia foram eles reconhecidos como associação de Direito Pontifício. Por assim dizer, é também sua festa de aniversário.

Peçamos à Mãe de Deus e da Igreja a graça de amar o Papado na pessoa de todos os Papas, tal como amamos a Nosso Senhor em todas as hóstias de todos os tabernáculos. 

(Revista Arautos do Evangelho, Fev/2004, n. 26, p. 36 à 38)